Por
maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que cabe à Justiça Comum julgar processos decorrentes de
contrato de previdência complementar privada. A decisão ocorreu nos Recursos
Extraordinários (REs) 586453 e 583050, de autoria da Fundação Petrobrás de
Seguridade Social (Petros) e do Banco Santander Banespa S/A, respectivamente. A
matéria teve repercussão geral reconhecida e, portanto, passa a valer para
todos os processos semelhantes que tramitam nas diversas instâncias do Poder
Judiciário.
O
Plenário também decidiu modular os efeitos dessa decisão e definiu que
permanecerão na Justiça do Trabalho todos os processos que já tiverem sentença
de mérito até a data de hoje. Dessa forma, todos os demais processos que
tramitam na Justiça Trabalhista, mas ainda não tenham sentença de mérito, a
partir de agora deverão ser remetidos à Justiça Comum.
O
ministro Marco Aurélio foi o único divergente nesse ponto, porque votou contra
a modulação.
Relatora
A
tese vencedora foi aberta pela ministra Ellen Gracie (aposentada) ainda em
2010. Como relatora do RE 586453,
a ministra entendeu que a competência para analisar a
matéria é da Justiça Comum em razão da inexistência de relação trabalhista
entre o beneficiário e a entidade fechada de previdência complementar. De
acordo com ela, a competência não pode ser definida levando-se em consideração
o contrato de trabalho já extinto como no caso deste RE. Por essa razão, a
ministra concluiu que a relação entre o associado e a entidade de previdência
privada não é trabalhista, estando disciplinada no regulamento das
instituições.
O
RE 586453 foi interposto pela Petros contra acórdão do Tribunal Superior do
Trabalho (TST) que reconheceu a competência da Justiça Trabalhista para julgar
causas envolvendo complementação de aposentadoria por entidades de previdência
privada. A Petros alegou que foram violados os artigos 114 e 122, parágrafo 2º,
da Constituição Federal, tendo em vista que a competência para julgar a causa
seria da Justiça Comum, pois a relação entre o fundo fechado de previdência
complementar e o beneficiário não seria trabalhista.
Após
o voto da ministra Ellen Gracie, o ministro Dias Toffoli manifestou-se no mesmo
sentido do entendimento da relatora. Na sessão de hoje, reafirmando seu voto, o
ministro citou a Emenda Constitucional 20/1998, que deu nova redação ao
parágrafo 2º do artigo 202 da Constituição Federal. De acordo com essa regra,
“as contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais
previstas nos estatutos e regulamentos e planos de benefícios das entidades de
previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes”.
Dias
Toffoli também destacou que a proposta trazida pela ministra Ellen Gracie “dá
solução ao problema”, porque outra alternativa manteria o critério de analisar
se haveria ou não, em cada processo, relação de contrato de trabalho. Esse
mesmo entendimento foi acompanhado pelos ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes e
Celso de Mello. O ministro Marco Aurélio também deu provimento ao recurso, mas
por fundamento diverso.
O
ministro Gilmar Mendes destacou que, por envolver a questão de competência, a
indefinição e insegurança jurídica se projetam sobre a vida das pessoas que
buscam a complementação nos casos determinados. “Acompanho o voto da ministra
Ellen Gracie reconhecendo a competência da Justiça Comum e também subscrevendo
a sua manifestação no que diz respeito à modulação de efeito, exatamente para
dar encaminhamento a esses dolorosos casos que dependem, há tantos anos, de
definição”, afirmou o ministro Gilmar Mendes.
Também
ao acompanhar a ministra Ellen Gracie, o decano da Corte, ministro Celso de
Mello, enfatizou que “é necessário estabelecer um critério objetivo que resolva
a crescente insegurança e progressiva incerteza que se estabelece em torno
dessa matéria”.
Voto-vista
O
presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, apresentou seu voto-vista na
sessão de hoje e acompanhou o posicionamento do ministro Cezar Peluso
(aposentado) em voto apresentado em março de 2010, no qual defendia a
competência da Justiça do Trabalho para julgar os casos de complementação de
aposentadoria no âmbito da previdência privada quando a relação jurídica
decorrer do contrato de trabalho. Esse posicionamento ficou vencido e contou
também com o voto da ministra Cármen Lúcia. O ministro Peluso era o relator do
RE 583050, de autoria do banco Santander Banespa S/A contra decisão do Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS).
Conforme
defendeu o ministro Peluso na ocasião do seu voto, caberia ao juiz da causa
avaliar se determinados processos iriam tramitar na Justiça do Trabalho ou na
Justiça Comum. De acordo com ele, se o processo fosse decorrente de contrato de
trabalho, seria de competência da Justiça do Trabalho, mas se a matéria não
estivesse relacionada ao contrato de trabalho, a Justiça Comum seria competente
para análise do processo.
O
ministro Joaquim Barbosa afirmou em seu voto que não vê como “segregar o
contrato de previdência privada complementar das relações de direito de
trabalho eventualmente existentes entre o indivíduo e o patrocinador, com
repercussão no que tange à fixação da Justiça Comum como a competente para o
julgamento dos conflitos decorrentes desse tipo de ajustes”.
“Refuto
a tese de que o artigo 202, parágrafo 2º, poderia amparar a conclusão de que a
Justiça do Trabalho não seria mais competente para decidir as ações que
envolvem o pleito de complementação da aposentaria”, afirmou o presidente.
De
acordo com a proclamação do julgamento, a maioria dos ministros (6x3) deu
provimento ao RE 586453 e, por outro lado, negou provimento ao RE 583050, sendo
que o ministro Marco Aurélio foi o único vencido neste último.
Modulação
Também
na sessão desta quarta-feira, ao resolver uma questão de ordem, o Plenário do
Supremo entendeu necessária a maioria de dois terços dos votos – conforme
previsto no artigo 27 da Lei 9.868/99 (Lei das ADIs)* – para a modulação aos
efeitos de decisões em processos com repercussão geral reconhecida. Portanto,
este entendimento formado pela maioria da Corte (5x4), quanto à exigência do
quórum qualificado nestes casos, foi aplicado hoje no julgamento do RE 586453 e
será aplicado a partir de agora em matérias semelhantes.
Cinco
ministros [Teori Zavascki, Rosa Weber, Cámen Lúcia, Marco Aurélio, Joaquim
Barbosa] consideraram que deve ser cumprido o quórum qualificado para modulação
de efeitos em recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida.
Ficaram vencidos quatro ministros: Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e
Celso de Mello, os quais entenderam ser possível a modulação, nesses casos, por
maioria absoluta do Tribunal.
*Artigo
27 da Lei 9.868/99 – Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato
normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional
interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços
de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só
tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que
venha a ser fixado.
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