Foram
cinco ministros favoráveis aos embargos infringentes no mensalão e cinco
contrários; Celso de Mello, decano da Corte, será o voto de minerva e sofre
pressão para rejeitar a admissibilidade do recurso
Com
placar empatado em 5 a
5, o STF (Supremo Tribunal Federal) adiou para a semana que vem a decisão sobre
a admissibilidade dos chamados embargos infringentes, que podem beneficiar 12
condenados no julgamento do mensalão. O voto de minerva será do decano da
Corte, ministro Celso de Mello, alvo de pressões de última hora para mudar seu
entendimento favorável à validade desse instrumento jurídico na ação penal 470. A sessão será retomada
na próxima quarta-feira.
Caberá a Celso de Mello (de pé) o voto de desempate sobre a admissibilidade dos infringentes
Sabendo
da responsabilidade que terá o decano, já na sessão de hoje, alguns ministros
adotaram algumas estratégias típicas de advogados para tentar convencer o
colega de suas respectivas teses. O ministro Ricardo Lewandowski,
vice-presidente do Supremo e favorável aos embargos infringentes, citou
nominalmente uma decisão proferida pelo decano no ano passado em caso
semelhante ao do mensalão. Na Ação Penal 409, Celso de Mello se disse favorável
aos infringentes.
Do
outro lado, o ministro Marco Aurélio Mello, contrário aos embargos, se referiu
“ao peso descomunal” nos ombros do decano, que será responsável pelo desempate
da questão no Supremo. “Que responsabilidade, hein, ministro Celso de Mello?”,
disse Marco Aurélio ao colega.
O
ministro Gilmar Mendes, também contrário aos infringentes, classificou como
“casuístico” o recurso. “Veja a repercussão que isso terá para a magistratura
como um todo, que hoje está olhando esse tribunal”, emendou Mendes em
referência ao futuro voto de Celso de Mello. Em determinados momentos do
julgamento, Mendes olhava fixamente para o colega enquanto criticava a vigência
dos embargos infringentes.
Durante
toda a sessão desta quinta-feira, Celso de Mello evitou comentar a opinião dos
colegas, uma postura completamente diferente da adotada normalmente pelo decano
em julgamentos do Supremo. O decano manteve um semblante pesado e distante e
também demonstrou nervosismo e extremo desconforto durante toda a sessão.
Evitou risos e se destinou a trabalhar em outros processos durante a sessão de
hoje.
Placar no Supremo
Dos
quatro ministros que votaram hoje, somente Lewandowski foi favorável aos
infringentes. Foram contrários Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio
Mello. Ontem, dos seis ministros que votaram , dois foram contrários – o presidente
do STF, Joaquim Barbosa, e Luiz Fux – e quatro foram favoráveis – os ministros
Luís Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber e Dias Toffoli.
A
expectativa inicial era de que o julgamento da validade dos embargos
infringentes terminasse ontem. Na sessão de quarta-feira, o presidente do
Supremo terminou a sessão pelo menos 30 minutos mais cedo para tentar
capitalizar os votos de Celso de Mello e Cármen Lúcia contra os infringentes.
Já no intervalo desta quinta-feira, havia uma movimentação no Supremo para
atrasar, ainda mais, a decisão. O intuito era dar “mais tempo” para o decano da
Corte repensar seu posicionamento favorável à validade dos embargos
infringentes, conforme fontes no Supremo.
Antes
mesmo do voto de Marco Aurélio Mello, já se buscava uma forma para que Celso de
Mello não tivesse tempo de iniciar sua análise hoje. Os ministros concordaram
em encerrar a sessão por volta das 18h30 sob a justificativa de que haveria
sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) (Cármen Lúcia, Marco Aurélio Mello
e Dias Toffoli fazem parte do tribunal eleitoral). Mas, em outras situações, o
presidente do Supremo deu continuidade a sessões mesmo com a ausência de
ministros que atuam também no TSE.
O
clima no Supremo durante as sessões desta semana foi de extrema tensão. Tanto
entre os advogados dos réus do mensalão, quanto entre os ministros da Corte.
Nesta quinta-feira, por exemplo, houve um desconforto entre os ministros Marco
Aurélio Mello e Luís Roberto Barroso.
Ao
defender os embargos infringentes, Barroso disse que interpretava a
Constituição independentemente da opinião pública. Já Marco Aurélio respondeu
que, “como servidor”, ele devia “contas aos seus contribuintes”. “Eu não estou
almejando ter manchete favorável. Eu sou um juiz constitucional”, disse Barroso.
“Eu não estou subordinado à multidão, estou subordinado à Constituição”,
pontuou o novato da Corte. “Vejo que o novato parte à crítica ao próprio
colegiado como partiu em votos anteriores”, respondeu Marco Aurélio.
Os embargos infringentes
Os
embargos infringentes, se aceitos, garantem novo julgamento aos réus que
obtiveram quatro votos a favor de sua inocência durante a análise de alguns
crimes na Corte. São eles: João Paulo Cunha, João Cláudio Genu, Breno Fischberg
e Simone Vasconcelos (no crime de lavagem de dinheiro); José Dirceu, José
Genoino, Delúbio Soares, Marcos Valério, Kátia Rabello, Ramon Hollerbach,
Cristiano Paz e José Salgado (no de formação de quadrilha).
A
discussão sobre os embargos infringentes dividiu os ministros do Supremo, uma
vez que esse instrumento não está previsto no ordenamento jurídico nacional. Os
recursos e ações processuais no STF são regulamentados por meio da lei 8.038
de1990. O Supremo, contudo, contempla os embargos infringentes em seu regimento
interno, por meio do artigo 333, que foi elaborado antes da Constituição de 1988. A questão que foi
debatida era se uma norma do regimento interno do Supremo, escrita antes da
Constituição de 88, foi revogada pela lei ordinária pós-Constituição. Para a
maioria dos ministros, não se pode falar em revogação porque essa questão dos
infringentes não foi mencionada de forma expressa pela nova lei.
Se
a maioria dos ministros concordar com a validade do recurso, a análise do caso
não será imediata. Um novo ministro será escolhido para relatar esta fase do
julgamento, e os advogados terão 15 dias, após a publicação do acórdão (o texto
final) para apresentar os recursos. Barbosa e Lewandowski, relator e revisor da
ação penal, respectivamente, não poderão ser responsáveis por relatar os recursos.