A
ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os efeitos de
todas as decisões da Justiça do Trabalho que tenham determinado o bloqueio de
valores nas contas do estado para satisfazer débitos trabalhistas da Empresa de
Assistência Técnica e Extensão do Ceará (Ematerce). Também estão suspensas as
execuções judiciais trabalhistas contra a estatal cearense que tenham
desconsiderado a sua sujeição ao regime de precatórios. A ministra determinou
ainda a imediata devolução aos cofres públicos dos recursos que ainda não
tenham sido repassados aos beneficiários de tais decisões.
As
determinações constam de liminar concedida pela ministra Rosa Weber na Arguição
de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 437, ajuizada pelo governador
do Ceará, Camilo Santana, na qual questiona as decisões de juízes do Trabalho
do Ceará e do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região. Segundo a ação, por
prestar serviço público em caráter exclusivo, a execução das dívidas da Ematerce
deve ocorrer por meio de precatórios. Segundo o governador, os bloqueios já
efetivados nas contas públicas superam a quantia de R$ 1 milhão e há ainda
determinação de bloqueio superior a R$ 5,5 milhões. Em sua decisão, a ministra
Rosa Weber afirma que a controvérsia se enquadra em hipótese de lesão a
preceitos fundamentais, como bem demostrado pelo governador. A liminar será
levada a referendo do Plenário do STF.
O
entendimento do TRT do Ceará é de que a Ematerce não se sujeita ao regime de
precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal para execução contra
a fazenda pública, porque se trata de ente dotado de personalidade jurídica de
direito privado. O bloqueio é endereçado às contas públicas da Administração
Direta do estado sob o fundamento de que existiriam nessas contas valores
pertencentes à Ematerce. A ministra observou que, de fato, nos termos do artigo
173, parágrafo 1º, inciso II, da Constituição Federal, a empresa pública ou a
sociedade de economia mista que explora atividade econômica de produção ou
comercialização de bens ou de prestação de serviços está sujeita ao regime
jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e
obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários.
Ocorre
que, segundo observou a relatora, o entendimento pacífico do STF diferencia as
empresas públicas prestadoras de serviço público daquelas que exercem atividade
econômica para fins de execução de suas dívidas judiciais. A partir dessa
distinção, a jurisprudência do STF firmou-se no sentido de que somente as
empresas públicas que exploram atividade econômica em sentido estrito estão
sujeitas ao regime jurídico próprio das empresas privadas. “Extraio da
documentação trazida aos autos que a Ematerce, embora constituída sob a forma de
empresa pública, não explora atividade econômica em sentido estrito, em regime
de mercado. Antes, desempenha atividade de Estado, em regime de exclusividade e
sem finalidade de lucro, dependendo integralmente do repasse de recursos
públicos”, observou Rosa Weber.
De acordo
com a Lei estadual 13.875/2007, a Ematerce integra a estrutura administrativa
do Poder Executivo cearense, e tem por finalidades institucionais “a promoção e
execução da política agrícola estadual, compreendendo o desenvolvimento das atividades
relativas à assistência técnica e à extensão rural sustentável do Estado,
utilizando processos educativos que assegurem a apropriação de conhecimento e
informações a estes produtores e suas organizações, bem como regulamentar os
regulares atendimentos técnicos e integrados nas gestões municipais e entidades
privadas quando componentes de políticas subsidiadas com recursos públicos”. E,
de acordo com o artigo 187, inciso IV, da Constituição, a assistência técnica e
a extensão rural são instrumentos de realização da política agrícola do Estado,
traduzindo, portanto, atividades estatais típicas.
“Nessas
circunstâncias, entendo, ao menos em juízo perfunctório e sem prejuízo de exame
mais aprofundado, que sobre a atividade desempenhada pela Ematerce não incide o
disposto no artigo 173, parágrafo 1º, inciso II, da Lei Maior, sujeitando-se, a
cobrança dos débitos por ela devidos em virtude de condenação judicial, ao
regime de precatórios assegurado pelo artigo 100 da Constituição da República”,
afirmou. A ministra acrescentou que as ordens de bloqueio revelam aparente
usurpação de competências constitucionais reservadas ao Poder Executivo
(exercer a direção da Administração) e ao Poder Legislativo (autorizar a
transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria de
programação para outra ou de um órgão para outro), indicando violação ao
princípio da separação dos Poderes.
“A
subtração das competências dos Poderes Executivo e Legislativo na execução das
despesas sugere haver indevida interferência do Poder Judiciário na
administração do orçamento e na definição das prioridades na execução de
políticas públicas, em conflito com o disposto nos artigos 2º e 84, inciso II,
da Carta Política, o que suscita preocupações também sob o prisma da harmonia
entre os Poderes. Além de comprometer a autonomia administrativa do estado, por
retirar do chefe do Poder Executivo os meios essenciais à alocação de recursos
financeiros, a proliferação de decisões judiciais determinando constrições
imediatas, em descompasso com o cronograma de desembolso orçamentário, parece
colocar alguns credores em situação mais vantajosa do que outros em igual
situação fática e jurídica, quebrando a isonomia”, concluiu a ministra.
VP/AD
Nenhum comentário:
Postar um comentário