Empreendedores catarinenses erguem edifícios residenciais gigantes em Balneário Camboriú, para clientes endinheirados do Sul; infográfico mostra prédios mais altos do Brasil
Villa Serena, em Balneário Camboriú
Edifícios altos sempre foram símbolos de prestígio e poder econômico. Pirâmides, igrejas góticas, torres como a projetada na França por Eiffel. China e Dubai fornecem exemplos recentes disso. Mas mesmo durante a Grande Depressão americana, na década de 1930, disputas entre empresários deram origens a ícones como o Empire State Building. Da mesma forma que Nova York, nos Estados Unidos, a capital paulista, com seus bancos e indústrias, virou o epicentro brasileiro das extravagâncias construtivas. Prédios como o Edifício Itália, concluído em meados da década de 1960, são até hoje marcos de ascensão da uma colônia inteira de imigrantes.
Agora, porém, uma nova geração de prédios residenciais ameaça a hegemonia de São Paulo como terra dos arranha-céus mais altos do país. E dois dos principais responsáveis por este movimento são empresários catarinenses, com passado e presente ironicamente similares. Rogério Rosa e Francisco Graciola, respectivamente fundadores das construtoras Embraed e FG Empreendimentos, iniciaram a vida empresarial de forma bem menos glamorosa, como “reis do X-Salada”.
Os empreendimentos que têm projetado nacionalmente a dupla são edifícios de mais de 40 andares, que superam os 160 metros de altura e estão sendo construídos em uma pequena cidade do litoral de Santa Catarina, onde a densidade de prédios é uma das maiores do mundo. Espécie de Guarujá do Sul, Balneário Camboriú vê sua população de 150 mil habitantes passar de 1 milhão no verão, anabolizada por visitantes catarinenses, paranaenses, gaúchos, paulistas e argentinos.
Com duas torres de 46 andares, o Villa Serena, da Embraed, por exemplo, tem apenas cinco metros a menos que o emblemático Edifício Itália, atualmente o segundo maior arranha-céu do Brasil. E o Alameda Jardins, da FG, será meros 20 centímetros menor que o líder atual do ranking, o Mirante do Vale do Anhangabaú. Mas, se contados só os prédios puramente residenciais, eles serão em breve os mais altos do Brasil.
A FG tem ainda outros três edifícios com perfil semelhante em obras e a Embraed faz planos de erguer um prédio com 73 pavimentos.
São, de modo geral, imóveis de luxo à beira mar, com não mais de duas unidades por andar e área de lazer que tem de piscina aquecida à sala de cinema. Dos apartamentos mais altos, é possível avistar toda a orla, e, ao fundo, os limites urbanos da cidade. Imóveis baratos, neste mercado, diz Carlos Haacke, presidente do Sindicato da Indústria da Construção local, saem por R$ 2 milhões. Mas coberturas podem chegar aos R$ 15 milhões.
É dinheiro que chega à cidade pelas mãos de fazendeiros do interior do Paraná e estados do Centro Oeste, que enriqueceram com o aumento do preço das commodities na última década. Ou de empresários de estados do Sul, donos de fábricas e empresas de serviços que prosperaram com o crescimento recente do país. Há também profissionais liberais, de médicos a engenheiros; jogadores de futebol e aposentados, muitos aposentados – concentrada, Balneário Camboriú permite que tudo seja feito a pé.
Passado modesto
Rosa costuma usar o contraste entre seu passado como dono de lanchonete e o presente à frente da Embraed para fazer graça, quando fala da própria trajetória empresarial. “Eu pensava em como me dar bem na vida e tudo que eu não queria era carregar peso”, diverte-se.
Quando um irmão faliu um trailer de lanches em Joaçaba, no Oeste catarinense, o empresário tinha dinheiro para salvar e assumir o negócio, que viria a ser seu primeiro sucesso comercial. Vendeu depois a um advogado e, com lucro, e voltou para Itajaí, onde moravam os pais. “Sou agradecido. Hoje, eu poderia ser o rei do X-salada de Joaçaba”, brinca.
Graciola, da FG Empreendimentos, foi ainda mais longe no ramo dos lanches e bebidas. De aprendiz de barbeiro, passou a titular e comprou uma lanchonete vizinha à barbearia, em Blumenau. Assumiu o negócio com a mulher e passou a usar as economias para adquirir outras. No auge, chegou a ter 15 empreendimentos, entre bares, restaurantes e choperias.
Tanto Rosa quanto Graciola entraram no ramo da construção em meados da década de 1980, e viram seus negócios explodirem a partir de 2003. Na época, ainda encontraram terrenos à beira mar para comprar e, principalmente, permutar por apartamentos nos prédios que pretendiam construir. Os dois foram mais rápidos que os concorrentes e garantiram a maioria dos espaços nobres da cidade, em condições favoráveis.
Arranha-céus
A decisão de construir prédios mais altos veio em seguida, para garantir que o investimento nos terrenos, cada vez mais valiosos, fosse diluído sem prejuízo ao padrão dos imóveis. No espaço de quatro prédios de dez andares, as duas construtoras passaram a projetar apenas um, mas com a mesma área útil dos quatro.
Mais alto e estreito, um edifício ganha em circulação de ar; espaço para a instalação e áreas de lazer no térreo, privacidade (as janelas ficam mais afastadas das dos edifícios vizinhos) e prestígio, em especial para quem vai morar na cobertura. “É um elemento de status”, afirma Mônica Barg, diretora de locação da consultoria Jones Lang LaSalle. “Trata-se de estar, literalmente, por cima”.
Não à toa, principalmente em cidades que têm vistas agradáveis, as unidades mais altas costumam custar de 20% a 25% mais caro, diz Mônica. Mesmo exigindo fundações mais caras, compensa.
“Principado”
O sucesso dos empreendimentos das duas construtoras até agora fez com que Graciola e Rosa ganhassem entre seus pares locais o status de visionários. Rosa, ao menos, se comporta como tal.
De pé na escada de madeira do lobby do Infinity Blue, seu resort na Praia dos Amores, em Balneário Camboriú, o empresário dificilmente seria reconhecido hoje por ex-clientes de seu trailer de lanches em Joaçaba, no Oeste de Santa Catarina, onde estabeleceu o primeiro negócio. De calça jeans e camisa polo, parado ao lado de um Mercedes esporte branco, ele fala sobre os planos que tem para o empreendimento turístico, que assumiu há cerca de oito meses e se tornou o centro de suas atenções.
“O paraíso é muito comentado na Bíblia. Todo mundo que ir para lá. Nós vamos oferecer aqui um pedaço dele, para que as pessoas possam desfrutar em vida”, diz o empresário sobre o novo projeto do resort.
Sua versão mundana do Éden é uma espécie de “principado” do entretenimento para ricos aposentados, uma mistura de “Las Vegas, Miami e Dubai”, define. No papel, o projeto tem teatros com estrutura para receber espetáculos da Broadway, shopping centers de marcas de luxo, hotel de 40 andares, 2 mil apartamentos residenciais em 25 torres de 30 andares e estacionamento para 10 mil carros. Tem também 15 restaurantes temáticos à beira mar, berço de atracação para cruzeiros e marina para “300, 400 iates”, quase o número de sanduíches que Rosa vendia por dia no auge de sua primeira lanchonete.
O empresário ainda não tem dinheiro para tanto – o custo de construção é estimado em entre US$ 2,5 bilhões e US$ 3 bilhões. No ano passado, sua construtora teve receita de cerca de R$ 100 milhões, calcula. Mas acredita que o projeto é impactante o suficiente para atrair a maior parte de sua clientela tradicional, formada majoritariamente por empresários e agricultores dos estados do Sul. “Metade dos meus clientes são VIP. Vindos do Interior do Paraná”, brinca.
Reservado
Graciola, da FG Empreendimentos, é bem mais reservado. Seu filho Jean, sócio no negócio, é quem faz às vezes de porta-voz. Cabelos repartidos ao lado, impecavelmente penteados, Jean conta que no momento a empresa que comanda ao lado do pai está envolvida em um processo de profissionalização da gestão, que deverá estar concluído no ano que vem.
É parte de um projeto maior de expansão, que inclui a abertura de mercados emergentes no estado, como Lages, Indaial e Timbó; a entrada na área de prédios corporativos, em cidades como Blumenau, Balneário Camboriú e Itajaí; e a criação de uma nova marca, a NEO.G, para atuação em um segmento de renda intermediário, com apartamentos de até R$ 400 mil. Soa como o oposto do que pretende Rosa. Mas, como diz o fundador da Embraed, se não der certo, já valeu a pena.
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