O
médico Marcos Sabino, mestre em saúde coletiva pela Universidade de Campinas
(Unicamp) e perito do Ministério Público do Trabalho (MPT), apresentou dados
que revelam que muitas empresas só notificam corretamente os casos de doenças
ocupacionais relacionadas ao amianto a partir de ações do MPT. Em dois casos
envolvendo grandes empresas, a assinatura de termos de ajustamento de conduta
(TAC) neste sentido resultou em alterações significativas no número de
notificações.
O
primeiro caso foi o da Brasilit, atual Saint-Gobain, denunciada ao Ministério
Público por não informar ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) os casos de
doença ocupacional. Por meio de ação civil pública ajuizada pelo MPT, a Justiça
do Trabalho compeliu a empresa a emitir as comunicações de acidente de trabalho
(CAT). O caso atualmente se encontra no Tribunal Superior do Trabalho (TST), em
grau de recurso.
Em
2007, a
empresa firmou TAC se abstendo de usar o amianto e se comprometendo a emitir
CAT em relação a 613 trabalhadores expostos que já apresentavam problemas de
saúde. Atualmente, o número chega a 702, num grupo de 6 mil pessoas. Segundo
Sabino, desde o início da atividade da Brasilit, 55 mil pessoas estiveram
diretamente expostas ao risco.
O
outro caso é o da unidade da Eternit em Osasco (SP), que encerrou suas
atividades em 1993. Num universo de 4.300 trabalhadores, foram emitidas 287
CATs e firmados 1.588 acordos individuais, contra 1.300 na Brasilit-Saint
Gobain.
Perfil
A partir das comunicações feitas ao Ministério do
Trabalho, foi possível traçar um perfil do trabalhador atingido pelos problemas
decorrentes do amianto. A maioria é de homens que, na época do diagnóstico,
tinham mais de 50 anos de idade, casados e muitos deles aposentados.
Os
mais afetados são aqueles que atuavam como moldadores, serventes e aprendizes.
Mas o levantamento inclui atividades que não costumam ser associadas ao risco,
como diretor, auxiliar de cozinha, contador e jardineiro. O tempo de latência
da doença variou de 21 a
mais de 40 anos, e os casos mais frequentes são os de placas pleurais,
asbestose, mesotelioma e câncer de pulmão. Pelo menos 110 trabalhadores tinham
dois diagnósticos.
Invisibilidade social
Apesar da prévia existência de informações sobre a
morbidade no setor, Marcos Sabino ressalta que as informações só vieram à luz
após a intervenção do MPT por meio dos termos de ajustamento de conduta. “A
insuficiência de notificação está associada à invisibilidade social e
sanitária”, afirmou. E a responsabilidade não é apenas das empresas, em sua
opinião. “O sistema todo, que deveria fazer a vigilância, não o faz.”
Um
dos argumentos dos defensores da crisotila contestado pelos dados levantados
pelo perito é o de que o uso controlado do amianto minimiza os riscos. Sabino
rebateu a tese de que, com a adoção de medidas de controle, a partir de 1980,
os problemas estariam sob controle e que os casos existentes seriam
remanescentes de uma época em que o amianto era usado de forma indiscriminada.
Sua base de dados apresenta pelo menos 21 casos nos quais o contato com o
agente danoso ocorreu depois de 1980.
Apesar
de instrumentos normativos como as Convenções 139 e 162 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT) e das regulamentações dos Ministérios da Saúde
e do Trabalho, o especialista afirma que o trabalhador ainda não está
adequadamente protegido e as informações existentes não revelam a verdadeira
realidade epidemiológica. “O custo do problema é enorme para as pessoas e para
o SUS”, lamenta. “Estamos lidando com pessoas adoecidas, que estão morrendo ou
sofrendo e convivem com a dúvida em relação a seu prognóstico de saúde. A
grande maioria não está protegida por programas adequados de higiene e saúde do
trabalhador”.
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